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Crítica | The United States vs. Billie Holiday é um recorte infértil

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O cinema está recheado de filmes com figuras talentosas que sofrem com a questão das drogas. Do mesmo modo, existem tantos trabalhos que trazem à tona o sofrimento negro, com personagens perseguidos injustamente. O próprio diretor de The United States vs. Billie Holiday, Lee Daniels, esteve à frente de Preciosa: Uma História de Esperança (lançado em 2009) e O Mordomo da Casa Branca (de 2013). E, nesse sentido, quanto mais melhor, porque a conscientização pode surgir a partir da arte.

Acontece que, somente na temporada atual, outros filmes conseguem ser tão mais efetivos na proposta que este em questão acaba tendo suas fraquezas expostas, em carne viva. A Voz Suprema do Blues (de George C. Wolfe, 2020), Uma Noite em Miami... (de Regina King, 2020) e Judas e o Messias Negro (de Shaka King, 2021), por exemplo, expõem três lados da mesma moeda cada um à sua maneira. O trabalho de Daniels, portanto, pode ser visto, entre eles, como o patinho feio... que não vira um cisne.

Andra Day (Billie Holiday) e Kevin Hanchard (Louis Armstrong) em cena. (Imagem: Divulgação/Lee Daniels Entertainment)

Atenção! Esta crítica pode conter spoilers sobre o filme!

Um recorte de uma personalidade infinita

The United States vs. Billie Holiday tenta começar já mostrando a que veio, com Billie Holiday (Andra Day) em uma entrevista a Reginald Lord Devine (Leslie Jordan). Se ela está cansada e claramente doente, ele tem a euforia de um jornalista inútil. A ingenuidade dele é tão racista quanto o racismo enraizado que insiste em existir. "Como é ser uma mulher de cor?", ele pergunta sorrindo bobo e com os olhos brilhando, sem conseguir se colocar minimamente no lugar daquela mulher em um país fortemente segregado.

"Como é ser uma mulher de cor?" (Imagem: Divulgação/Lee Daniels Entertainment)

Essa abertura, que tem suas continuações como flashes de vez em quando — e de um jeito um tanto quanto aleatório — é uma amostra bem condensada do que está por vir. E talvez funcionasse como um curta-metragem irônico e pesado. Por outro lado, Daniels quer deixar tudo tão bonito em meio ao caos que acaba por construir cenas e mais cenas sem criatividade e importância real. O início, assim, pouco a pouco perde força para um grande miolo que não consegue ter profundidade, cedendo espaço, inclusive, para piadas — aparentemente involuntárias — sobre o funeral de um pet.

É gigante, então, a atuação de Day, que mais parece um ímã com força suficiente para atrair e manter o interesse do espectador pelas mais de duas horas do filme. Em seu primeiro longa-metragem, a atriz é tão potente e encarna com tanta propriedade uma das maiores cantoras de jazz da história que todos os problemas idealizados pela direção podem até ser revertidos. Porque é difícil perceber a enormidade de uma atuação protagonista e não a associar ao filme em si. É difícil e lógico, visto que o trabalho da atriz faz parte da ideia geral. Ainda mais quando se trata de um recorte trágico de uma personalidade infinita.

Uma força imensa sufocada

Há — é verdade — tentativas de dar substância ao filme, como o debate que vai do agente Jimmy Fletcher (Trevante Rhodes) ao ascensorista (Furly Mac). Neste último caso, mesmo sendo rápido, Daniels demonstra lapsos de criatividade ao construir uma cena que diz muito mais pela decupagem em si do que por quaisquer palavras. Isso porque, ao expor o rapaz do elevador em close mesmo depois que Lady Day e Tallulah (Natasha Lyonne) se vão, o diretor submete a dor dele (do ascensorista) ao contexto do filme — justamente o que a protagonista e sua polêmica canção Strange Fruit representam: a dor daqueles que sofrem por ver os seus iguais padecerem e, por isso, resistem pelo medo do linchamento.

É uma pena, então, como Daniels opta por uma dinâmica de raros respiros como esse, intercalando cena após cena sem fomentar um interesse maior na situação. O foco é, de fato, Holiday. Isso não seria problema se o roteiro de Suzan-Lori Parks (de Filho Nativo), baseado no livro Chasing the Scream, de Johann Hari, pudesse ser carregado de subtextos ou, pelo menos, ter seus arcos bem desenvolvidos. Existem situações, inclusive, que mereciam substância: Jimmy sendo usado pelos agentes federais e, ao mesmo tempo, usando Holiday; a relação dela (Holiday) com Tallulah (um desprezo total tanto do romance real quanto da força que tem Lyonne como atriz); o evento de uma cantora tão lendária reunir negros e brancos na plateia em meio à segregação.

Mas tudo é somente pincelado. Daniels, junto ao diretor de fotografia Andrew Dunn (de O Segredo: Ouse Sonhar) pintam quase tudo com uma luz difusa romântica, deixando a dureza estética somente para os palcos. É verdade que cantar em público era, para Holiday, exercer a sua força mais genuína e, por isso, o diretor pecou novamente ao ter optado por um caminho biográfico sem muitas nuances — estas que só se revelam em um excelente flashback que diz mais sobre a cantora do que quase a totalidade das cenas.

Quase tudo com uma luz difusa romântica. (Imagem: Divulgação/Lee Daniels Entertainment)

No final das contas, o letreiro com o título do filme, bem no início, parece expressar imageticamente mais do que o restante: com o nome Billie Holiday agigantado e por cima do que se refere aos EUA. Isso em caráter imagético mesmo, porque é claro que interpretações mil podem surgir de uma obra que traz à tona a grandeza — mesmo sem deixar esta clara — de uma cantora incomparável; de uma personalidade vulnerável, mas com força imensa; de uma mulher que cantava canções românticas requintadas e, ao mesmo tempo, sentia-se abandonada pelo amor.

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Canaltech.

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